Um dia diferentemente igual a tantos outros

Hoje, tive um dia atípico, sai sem o carro. Andei de ônibus, de metro, a pé. Aproveitei para aguçar a minha percepção, prestando atenção nas pessoas, em seus rostos, suas expressões, no jeito de caminhar.

Passei pela estação Luz, pela Rua Florêncio de Abreu. Vendedores ambulantes, algumas obras em andamento, as pessoas pareciam felizes, apesar do calor escaldante. Fiquei imaginando o que estariam de fato sentindo, mas logo percebi que elas estavam apenas focadas no momento presente, o passado ou o futuro parecia não ter importância.

Na volta, descobri que agora tem ar condicionado no Metrô. Surpresa boa.

Depois ônibus, na fila pessoas de todas as idades e dos mais diferentes estilos. De repente vejo uma senhora empurrando uma mocinha cadeirante e totalmente dependente, sua cabeça precisava de apoio na própria cadeira, pois não se sustentava sozinha. A fila do ônibus aumentava. A senhora acarinhava a moça, tentando dar-lhe o máximo de conforto possível. Chegou também uma moça sozinha com sua bengala, era cega.

Fiquei pensando nas mazelas de cada um. Enquanto alguns, com seus carros, reclamam do calor e do transito, outros – mesmo com muitas limitações – enfrentam o calor e seguem de ônibus, sem reclamar.

O ônibus chegou e a moça cadeirante foi levada para entrar pela parte de traz e eu não vi mais o que aconteceu. Mas, percebi uma pequena confusão porque alguém reclamou que a moça na cadeira estava atrapalhando a passagem. Pode? Fiquei imaginando, o quanto o ser humano é capaz de romper limites, para o bem ou para o mal.

Já dentro do ônibus, de repente outra confusão. Um casal de meia idade começou a brigar. Descobri que eram desconhecidos um do outro. Tudo começou porque o homem dormia e caia no ombro da mulher. Hilário! Entrou a turma do deixa disso e virou uma comédia. A dupla acabou sossegando e a viagem seguiu com as pessoas rindo e se divertindo com a situação.

Ao meu lado, sentou uma senhora muito educada e começou um papo interessante. Perguntei se ela era professora. Acertei. Mas, ela fez questão de dizer que era professora aposentada. Disse que eu percebi que ela era professora por que ela era de outra geração, da geração em que os professores tinham uma melhor formação, eram mais preparados e aprendiam a ter postura. Falou que hoje em dia já não é assim... Depois comentou também sobre a precariedade da saúde, do zica vírus...

Uma tristeza imensa me invadiu. Lembrar que aqueles eleitos para estruturar um Brasil melhor e garantir uma melhor qualidade de vida para esse povo, simplesmente não estão nem aí e seguem desviando milhões sem que lhes pese a consciência.

Cheguei em casa, grata pela vida que tenho, mas triste por perceber “in loco” o quão carente é o nosso povo. Carente, mas ao mesmo tempo feliz dentro de sua própria realidade. A preocupação é com a sobrevivência, com o garantir a vida no dia de hoje, na certeza de que amanhã também será hoje. E assim, a história se repete, dia após dia. Não há possibilidade de ir além.

Lembrei-me do Paulo Francis. Lembram-se dele? Ele dizia “a ignorância é a maior multinacional do mundo”.

Será preciso ir mais ao fundo do poço para que se possa encontrar o antídoto do veneno que nos consome a cada dia? Esse veneno que apenas alguns são capazes de perceber, pois a maioria simplesmente o ingere na repetida realidade imutável do dia a dia ...

É. Hoje foi um dia diferentemente igual a tantos outros ...

Obs: texto escrito em 05/02/2016